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Vantagens de uma Mente Minimalista

Veneza era uma viagem que sempre sonhei realizar. Marquei voo para Itália quando a oportunidade surgiu. Não ia visitar apenas A Cidade Flutuante como iria começar o meu itinerário por Florença.
Curioso por experimentar, optei por fazer a ligação entre cidades através do TGV italiano. Reservas efetuadas, a minha mente encontrava-se focada em planear a exploração das centenas de canais e pontes. Porém, o meu principal problema persistia.
A Acqua Alta acontece todos os anos na cidade. No ano anterior, durante a mesma época, A Cidade da Água sofrera a pior inundação em 53 anos. Não poderia descartar o fenómeno durante a minha estadia.
Como chegaria ao hotel? De que forma iria atravessar a pé, carregado com malas, uma cidade de ruas estreitas, pontes e sem transporte acessível?

Viajar ensina-nos sobre compromissos. Ensina-nos e força-nos a discriminar o que é essencial. Ensina-nos a minimizar. Acabei por viajar de mochila às costas pela primeira vez. Contudo, o meu interesse pela filosofia do Minimalismo é recente.

Sentir Felicidade

Confio que todos nós já nos questionámos sobre o significado de felicidade e como nos tornar felizes. Acreditei nesta forma de pensar durante grande parte da minha vida até reparar na abordagem que estava a ter: ”como me tornar feliz“.
A minha crença tem vindo a alterar-se com tudo o que vivi, experienciei e aprendi. Não é uma questão de ”como me tornar feliz” mas sim de ”me sentir feliz“.
Nesta perspetiva, não há forma de eu saber como me sentirei no futuro, apenas consigo saber como me sinto no momento. O foco deve estar no presente, onde posso sentir felicidade.

O Minimalismo não reflete apenas um princípio anti materialista. É uma filosofia de vida que se define pela redução da atenção sobre tudo o que ocupa lugar na nossa mente e tomamos consciência de existir.

Sentir-me feliz consiste em minimizar todas as distrações que me impeçam de viver e fazer o que quero e gosto. De facto, existe presente uma componente anti materialista muito útil para viver melhor nos espaços do quotidiano.
No entanto, perdemos bastante se olharmos para o Minimalismo apenas como ferramenta para livrar de tralha e reduzir pertences.

“Habituar-se às coisas simples, a um modo de vida não luxuoso, portanto, não só é conveniente para a saúde, como ainda proporciona ao homem os meios para enfrentar corajosamente as adversidades da vida: nos períodos em que conseguimos levar uma existência rica, predispõe o nosso ânimo para melhor aproveitá-la, e nos prepara para enfrentar sem temor as vicissitudes da sorte.” - Carta sobre a felicidade: (a Meneceu) Epicuro

O impacto óbvio do minimalismo reflete-se diretamente na poupança. Adquirir apenas bens que necessito verdadeiramente, torna-me uma pessoa mais seletiva e resulta no aumento da percentagem de poupança. Por consequente, não só posso dispor de maior capital para investir, como posso transpor este modelo comportamental para a gestão e decisões de investimento.

Viés de confirmação

O produto mais importante de todo o processo minimalista é a obtenção de um estado de menor preocupação pela necessidade de confirmação. Deixamo-nos de preocupar com que lente os outros nos observam ou julgam. Esta vantagem não pressupõe que deixamos de nos comparar aos outros ou de sermos menos capazes de criar empatia, antes pelo contrário.

A comparação é uma característíca inata ao ser humano e um barómetro ao nosso estado interno. A menor preocupação para com as opiniões dos outros em relação a nós próprios permite reduzir a ansiedade, avaliar-nos e provocar mudanças com base no que queremos ser e não parecer. E, por consequente, uma mente resolvida, menos ansiosa e focada, terá mais energia para dedicar aos outros.

Por vezes, não deter ativos, não implica que somos capazes de impedir distrações devido à euforia que se vive nos mercados. Quando o fenómeno das ações da Gamestop (GME) surgiu, poucos entusiastas passaram ao lado e não foi fácil lidar com o desvaneio.
Na quantidade de posts das redes sociais que surgiram no momento, foi visível o sofrimento causado por quem entrou no jogo e a constante necessidade de confirmação sobre as próprias decisões.

Minimize os Mercados

Os primeiros dias depois do meu primeiro investimento em bolsa foram uma combinação de ansiedade, distração constante e zero produtividade. Foi o melhor que me podia ter acontecido.

Experienciar durante semanas todas essas emoções e impulsos constantes de espreitar a cotação dos meus ativos foi exaustivo. O mundo dos investimentos e especulação são das maiores distrações que podemos ter na vida. Bastou.
A dependência despertou uma questão que se formava na minha mente: investir, com perspetiva de um futuro melhor, significa ser um “escravo” dos meus ativos? Quantos mais ativos financeiros um investidor possui, maior é a probabilidade da sua atenção continuar a ser desviadas para os mesmos.

Deter um largo número de ações individuais é uma estratégia válida. Investir e não especular numa empresa, pressupõe uma análise e deliberação detalhada de vários fatores intrínsecos ao negócio e gestão. Todo esse processo requer também tempo e dedicação; tempo esse que, o investidor pode não desejar despender e coloca em causa retornos.
O problema escala sempre que uma nova posição é acrescentada ao portfolio: o nosso tempo permanece finito e o tempo de gestão aumenta. Mesmo automatizando a metodologia, estamos sempre a ser bombardeados com nova informação. O que me leva ao segundo ponto: menos ativos, menos informação, menos sobrecarga na mente, menos ansiedade.

Reduzir a exposição a este tipo de informação tóxica é a melhor abordagem para lidar com o ruído. O constante bombardeamento não serve de nada. Seja através das redes sociais ou dos gurus dos mercados que aparecem nos programas televisivos, a maioria deste conteúdo é inútil, falso, enviesado e muito pouco preciso. Não é conhecimento que consiga integrar numa estratégia razoável ou racional e, portanto, uma perda de tempo. Só se torna mais difícil manter o rumo com tanta distração e tentação.
É desmotivador ver tantos outros à nossa volta evaporarem a marca obtida pelos nossos retornos. Por vezes, esquecemos de uma característíca inata deste mundo: a comunicação e redes sociais são exímias a destacar os sobreviventes, mas, é raro vermos os milhares de perdedores que ficam pelo caminho. É natureza humana pura. A melhor forma de aceitar é desligar.

Reduzir os custos

Não só a nossa saúde mental beneficia com a ausência de preocupação. Um portfólio menor implica um potencial de custos menor. Existem várias corretoras cujo custo de transferência do portfólio é definido considerando um custo por cada posição. No caso dos custos de custódia, também pode haver um valor consoante a bolsa de origem ou posição.
Vão existir sempre mentes criativas a inventar novos formatos de comissões e custos. Um portfólio compacto é a melhor garantia para reduzir a exposição a este tipo de exploração.

Não pretendo que estes argumentos sejam mais um desincentivo à escolha individual de ações. Sobre esse aspeto, os factos e análise histórica são suficientes. Os custos extra de um portfolio individual só acrescenta pressão à necessidade de procurar retornos superiores e, por consequente, mais uma preocupação.
Investir de forma passiva também padece do mesmo mal se o investidor não refletir sobre as implicações de adicionar um novo fundo ou ETF ao seu portfólio. Seja pela exposição a determinado sector ou estratégia com o objetivo de maior retorno, é comum cair no erro de aquisição de ativos que acabam por prejudicar a taxa de encargos do portfólio ou acabam a sobrepor-se a outros, aumentando assim a exposição por vezes de forma inconsciente.
O termo diworsification já não é recente. Todos os anos surgem alegados novos produtos financeiros com os mesmos antigos riscos de investimento.

Foco no caminho

Satisfazer as nossas necessidades essenciais ainda deverá ser o mais prioritário e acessível. Parte do caminho para a nossa liberdade passa por nos consciencializar que só temos de satisfazer o nosso bem estar.

“Consideramos ainda a autossuficiência um grande bem; não que devamos nos satisfazer com pouco, mas para nos contentarmos com esse pouco caso não tenhamos o muito, honestamente convencidos de que desfrutam melhor a abundância os que menos dependem dela; tudo o que é natural é fácil de conseguir; difícil é tudo o que é inútil.”- Carta sobre a felicidade: (a Meneceu) Epicuro

Aproveitar a viagem e a vida enquanto investimos não é um ensinamento desconhecido para quem segue as referências na área da literacia financeira. Ser ponderado e preocupado é bom, mas viver exclusivamente para um futuro que não sabemos se vai existir também é um risco demasiado elevado.
Daniel Carnegi tem uma expressão muito divertida no seu livro: ”(…) estava a tentar lavar os pratos de hoje, de ontem e ainda os que nem sequer estavam sujos“.
Por vezes é bom termos cuidado para não cometer esse erro com a nossa vida e investimentos.


PRINCÍPIOS

Um atitude minimalista torna-nos seletivos nas necessidades e pode ajudar a nossa poupança.

Numa estratégia minimalista, o foco é viver melhor e sem tanta ansiedade dos mercados.

Um portfólio minimalista possui vantagens práticas na sua gestão e potencial de custos.


Posfácio: O meu obrigado por todo o feedback e receptividade positiva ao primeiro post deste novo projecto. Foi algo inesperado e que reforçou a minha motivação. Aos que subscreveram a newsletter, tentarei melhorar a cada publicação para que anseiem pela próxima.